Esse é o último post da série Net Zero. As outras postagens desta série você pode acompanhar nos links:
Net Zero: o futuro da construção
Como viabilizar um Edifício Net Zero Energy
Edifício Net Zero Water: como viabilizar?
Eu arriscaria dizer que o Net Zero Waste se trata do mais difícil de ser alcançado. Mas calma, o projeto é sim possível, e nós estamos aqui para simplificar um pouco as coisas.
Quando falamos em resíduos, logo pensamos no lixo doméstico produzido pelos humanos. No entanto, de acordo com o Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS), o setor da construção civil gera cerca de 30% de todo o lixo sólido produzido.
Isto porque a gestão de resíduos neste setor deve ser pensada em todo o seu processo: projeto, construção, operação e fim da vida útil.
Nessa leitura você aprenderá como executar o Net Zero Waste em todas estas fases e nós prometemos que, apesar da dificuldade, o desafio vale a pena! Vamos lá?
O que é Zero Net Resíduos?
A ideia de desperdício zero consiste em destinar todo resíduo gerado in loco – de construção e operação – para fins alternativos, desviando todo seu resíduo da incineração ou de aterros sanitários. Este conceito não é aplicado para lixos radioativos ou de contaminação altamente perigosa.
Fonte: Kazo – Solução Ambiental
Conhecendo o seu lixo
Primeiro você deve conhecer o seu lixo, neste caso o da obra. É essencial saber o que é possível ou não ser reciclável e onde destiná-lo. Conheça alguns materiais que geram dúvidas na hora do descarte:
- Espelhos: muito difícil de ser reciclado, portanto a solução é reutilizá-los em interiores ou artesanato;
- Lâmpadas: já existem tecnologias para reciclar, o ideal é devolvê-los aos fabricantes e não os separar para a coleta local;
- Porcelana e cerâmica: são fabricados pela mistura de vários elementos, no intuito de suportar várias temperaturas. Estes materiais possuem reciclabilidade difícil e reaproveitamento energético inviável. A solução é a reutilização em outras obras ou artesanatos, assim como, reinseri-los na própria cadeia produtiva da construção civil, como em concretos, argamassas e pavimentação;
- Saco de cimentos e cal: são recicláveis, mas ficam sujos com substâncias que podem contaminar outros materiais na reciclagem. Portanto as embalagens devem ser separadas dos outros resíduos e lavadas em um tanque com água de chuva, por exemplo. Após a secagem, o papel deve ser estocado e destinado a reciclagem. A borra obtida na lavagem do papel pode se transformar em artesanato;
- Roliça: o material da rolha de vinho não é reciclável, pode-se reutilizar na decoração e artesanato, entre tanto já existe tecnologia que fabrica pisos e revestimentos para parede com esse material;
- Plásticos não recicláveis: cabo de panela, tomadas, alguns tipos de isopor, adesivos, espumas, acrílicos, EVA. O ideal é reutilizá-los várias vezes antes de descartar ou criar outras utilidades para estes materiais;
- Latas de tintas: a lata é reciclável, mas deve-se ter alguns cuidados ao reciclá-la, pois a tinta pode contaminar o solo, água e outros materiais. Contudo use sempre toda a tinta da lata e nunca lave a embalagem. Deixe os restos secarem por pelo menos 24 horas – a tinta seca não atrapalha o processo de reciclagem. Se sobrar tinta tente não guardar, pinte outra coisa ou doe;
- O Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA publicou uma Resolução nº307/2002, que estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil, além de disciplinar as ações necessárias de forma a minimizar os impactos ambientais.
A composição dos resíduos sólidos da construção civil é classificada em A, B, C e D, conforme Art. 3° e suas alterações. Sendo esta classificação:
Fonte: costaesmeralda.eng.br
Viabilizando edificações Zero Net Resíduos
A viabilização de um projeto Net Zero Waste é conduzida pelo princípio dos três Rs: Redução, Reutilização e Reciclagem, que é frequentemente usado em pesquisas e práticas sobre gerenciamento de resíduos na construção.
A redução é o mais eficaz e eficiente dos métodos de gestão de resíduos, devido não apenas a minimização de geração e descarte de remanescentes no meio ambiente, mas também por diminuir o custo da construção de triagem de resíduos, transporte e descarte.
A reutilização de componentes pode desempenhar novamente a sua função ou ser reutilizado para outras finalidades. Na compra de insumos, quando possível, deve-se optar por materiais recicláveis ou cujas fontes de matéria-prima sejam renováveis.
O princípio dos três Rs pode ser encontrado nas seguintes estratégias de desperdício zero em edificações:
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REDUZIR
– Alterações na fase de projeto: planejamento inicial na elaboração do projeto – o uso da metodologia BIM é muito importante para esse propósito;
– Value Engineering (Engenharia de Valor): substituição de materiais e métodos por alternativas mais baratas, sem sacrificar a sua funcionalidade – diminuir excessos, reavaliar orçamentos, enxugar o projeto;
– Cálculo de materiais: um cálculo preciso diminui desperdícios;
– Compras planejadas: comprar o necessário, sempre de fornecedores pré-selecionados;
– Just in Time (No momento certo): solução que reduz o tempo de estocagem de materiais dentro do canteiro de obras, pois considera o seu recebimento “no momento certo” de sua utilização;
– Políticas no canteiro de obra: evita armazenamento, manuseio e aplicação indevida;
– Gerenciamento de resíduos: manejo e fiscalização das políticas do canteiro de obra.
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REUTILIZAR
– Projetos de reutilização: aproveitar insumos de outras obras, utilizar RCD (resíduos da construção civil) no próprio canteiro, reutilizar utensílios no dia-a-dia dos trabalhadores – não utilizar descartáveis;
– Implementação e projeto do canteiro de obra: o canteiro de obra pode ser reaproveitado de uma obra a outra; prever espaço para insumos com potencial de reutilização;
– Políticas no canteiro de obra: diretrizes para que que todos cumpram os projetos de reutilização no canteiro de obra;
– Gerenciamento de resíduos: separar materiais com potencial de reutilização e fiscalizar o cumprimento das ações.
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RECICLAR
– Alterações na fase de projeto: optar por materiais recicláveis, de matéria-prima reciclada ou cujas suas fontes sejam renováveis;
– Plano de destinação dos resíduos: entender como cada insumo pode ser reciclado e planejar a sua destinação antes da obra começar;
– Montagem do canteiro de obra: criar espaços destinados para a separação dos diferentes materiais;
– Materiais de suporte: organizar o suporte preciso para implementar o projeto de reciclagem;
– Políticas no canteiro de obra: regras para estabelecer como cada insumo deve ser reciclado;
– Gerenciamento de resíduos: separar os materiais com potencial de reciclagem e fiscalizar o cumprimento das ações.
Podemos sempre ir mais além, e alcançar melhores resultados. Por isso otimizou-se o princípio dos três Rs para os cinco Rs, acrescentando os conceitos de Repensar e Recusar.
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REPENSAR
– Área de projeto: construir menos e prover mais áreas com vegetação;
– Tipo de tecnologia empregada: optar por projetar, compatibilizar projetos e planejamento de obra pela metodologia BIM – evita retrabalhos e surpresas durante a obra;
– Escolha de materiais: deve-se basear na vida útil de projeto, no tipo de material, no seu ciclo de vida e na possível reutilização desse material; que possuem informações de sua análise do ciclo de vida EPD – Declaração Ambiental do Produto; com Certificado Cradle to Cradle (do berço ao berço) – ciclo de vida circular; que a sua fabricação conserve reservas naturais e seja seguro para o consumidor e planeta;
– Tipo de sistema construtivo: alvenaria estrutural, steel frame, wood frame e pré-fabricados reduzem significantemente a geração de resíduos na obra.
Modelo: Cradle to Cradle. Fonte: bluehair.co
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RECUSAR
– Empresas que não tenham responsabilidade ambiental na sua cadeia de produção e com suas embalagens;
– Empresas que não tenham plano de logística reversa;
– Materiais com transporte de longas distancias – se for necessário, justificar com escassez na região ou por ser muito compensador.
Para completar essa terminologia, acrescenta-se três novas palavras, obtemos então os oito Rs, que são:
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REPARAR
O conserto de itens que estavam em desuso tem que ser levado em consideração antes de comprar um novo.
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REINTEGRAR
Pela compostagem de rejeitos orgânicos e tratamento in loco dos efluentes.
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RESPONSABILIDADE
Temos o dever de criar responsabilidade com os nossos resíduos, não desperdiçar e contribuir com a educação ambiental; quando necessário, solicitar pessoas qualificadas e profissionais na área ambiental e de rejeitos sólidos.
Nove passos para um aterro sem lixo
A empresa General Motors (GM) compartilhou os 9 passos para ser Livre de Aterro, a qual aplica em sua empresa e são aplicáveis a empresas ou instalações de qualquer tamanho. Confira:
- Rastrear e documentar os seus resíduos;
- Definir zero desperdício – dentro da realidade local;
- Priorizar atividades de redução de resíduos;
- Envolver os funcionários e construir uma cultura de sustentabilidade;
- Fortalecer parcerias de fornecedores;
- Resolver desafios regulatórios;
- Obter isenção de aterro;
- Melhorar os esforços;
- Compartilhar as melhores práticas.
Métricas alcançadas pela GM
Para entender quais os benefícios alcançados com uma política Zero Net Waste, conheça os dados apresentados pela GM com o seu projeto Livre de Aterro em 2011:
- Reduzir CO2: Durante 2011, mais de 10 milhões de toneladas de emissões equivalentes de CO2 foram impedidas de entrar na atmosfera como resultado de seus programas de reutilização e reciclagem;
- Diminuir o depósito em aterros: A GM reciclou ou reutilizou mais de 2,5 milhões de toneladas métricas de resíduos em suas fábricas em todo o mundo em 2011 – o equivalente a 38 milhões de sacos de lixo;
- Ganhar receita: A GM aproxima sua receita anual de reciclagem e reutilização de subprodutos em cerca de US $ 1 bilhão por ano, possibilitada pelo uso de um sistema holístico de gerenciamento de subprodutos GM que combina benefícios ambientais e financeiros de todos os materiais da planta.
Dentro da execução de um projeto, principalmente Net Zero Waste, todos os setores devem estar de acordo com a Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/10). Esta Lei dispõe as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis.
Contudo para cada município existem suas limitações. Dentro da realidade da localidade, podemos sempre fazer o nosso melhor antes de acreditar que não é possível viabilizar um projeto Zero Net Resíduo.
A GM ainda pontua que: “Muito pode ser realizado com uma equipe entusiasta com experiência em instalações, energia e meio ambiente. Pensar de forma criativa percorre um longo caminho na ausência de recursos dedicados. As empresas também devem considerar juntar-se a grupos ambientais externos dedicados à eliminação de resíduos e eficiência de materiais para compartilhar ideias e participar de projetos cooperativos.”
Portanto, crie uma força-tarefa verde na sua empresa, conheça os incentivos do seu município para coleta seletiva, contrate empresas responsáveis pela coleta e destinação correta, faça parcerias com grupos ambientais, localize coletores autônomos, leve o seu resíduo até os pontos de coleta. Se informe e bote em ação!
Lembrando que a cultura Net Zero deve estar dentro da empresa em todos setores – desde o escritório, colaboradores, até o fim da obra.
Deixe nos comentários o que achou das dicas para viabilizar uma edificação Net Zero Waste. Vamos por em prática? Nos conte também se curtiu a série Net Zero. Até a próxima!
Fontes:
Architect Magazine – How to Achieve Net-Zero Waste and Water in Buildings
GM Corporate Newsroom – GM Makes the Business Case for Zero Waste