Quando começamos a ficar mais tempo em casa, passamos a perceber mais o ambiente em que vivemos e algumas coisas que antes sequer eram notadas. Agora, eis que aquela mancha em sua parede, que até então não existia, parece lhe encarar enquanto você trabalha de dentro do seu quarto, ou aquela fissurinha ao lado da porta que antes parecia ser apenas um fio de cabelo agora mais parece uma cratera, e o rejunte do revestimento que sempre pareceu perfeito, agora já está um pouco escuro, quase cinza. Cientificamente, esses problemas são conhecidos como patologia das edificações.
Isso tudo acontece porque assim como as pessoas as edificações também são expostas a doenças, que se não tratadas podem vir a progredir e se tornar um sério problema.
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Conceito de patologia das edificações
A palavra patologia é de origem grega (páthos, doença, lógos, estudo), e, de acordo com Weiszfolg (2018), é a ciência que estuda a origem, os sintomas e a natureza das doenças.
O termo patologia é rotineiramente aplicado em diversos campos de estudos científicos, em especial no campo da medicina, onde aborda tanto o conhecimento científico quanto as práticas clínicas. Esse campo estuda as alterações estruturais e funcionais de células, tecidos e órgãos possivelmente sujeitos a doenças.
Todas as doenças têm uma causa que age por determinados mecanismos, os quais produzem alterações morfológicas e/ou moleculares nos tecidos, que resultam em alterações funcionais do organismo ou parte dele, produzindo sintomas.
Desse ponto de vista, pode-se criar um paralelo entre a engenharia e a medicina. Assim como as pessoas, as edificações em algum momento da vida apresentarão defeitos muito similares a doenças. Defeitos que podem se manifestar de diversas maneiras, como por exemplo: fissuras, rachaduras, descolamentos, manchas, rupturas, etc.
Da mesma forma que as doenças humanas necessitam de atenção e cuidados, as mazelas encontradas nas edificações também precisam de cuidado. Dessa necessidade surgiu um novo campo da engenharia civil chamado de Patologia das Edificações, uma ciência que visa identificar as causas dos defeitos (diagnóstico) e a correção deles (terapia) (VERÇOZA, 1991).
O que causa patologia das edificações?
A grande variedade de serviços necessários para a construção e utilização de um edifício estão associados a várias formas de defeitos ou falhas. Pesquisas realizadas nesse âmbito nos auxiliam a identificar quais são as causas que reduzem a vida útil das edificações, destacando problemas relacionados a projeto, execução, reparos e manutenção de baixa qualidade.
No entanto, ao longo dos anos, qual desses fatores têm sido o protagonista pelo maior número de erros? É grande a lista de estudiosos que buscam relacionar as várias razões para a ocorrência de patologias nas edificações.
No quadro abaixo são apresentados resultados de pesquisas realizadas em diferentes países, pesquisas essas que englobam uma enorme gama de causas e que, devido ao fato de alguns autores não levarem em consideração as mesmas causas de classificação quanto a origem das patologias em seus estudos, podem superar 100%, não necessariamente havendo uma concordância entre os resultados obtidos.
O gráfico abaixo evidencia a alta percentagem de manifestações patológicas provenientes de não conformidades na etapa de projeto que, somadas às de planejamento geralmente ocupam o lugar das mais graves falhas nas obras civis. (WATT, 2007) tradução nossa (SOUZA; RIPPER, 1998).
Quais são as principais patologias das edificações?
Atualmente no Brasil, vários são os sistemas disponíveis para a execução de construções. Entre os materiais de fechamento para esses sistemas temo os blocos cerâmicos, blocos de concreto, blocos de gesso e painéis de gesso acartonado.
Por questão cultural, na prática construtiva nacional, os blocos de barro queimado (tijolos) e os blocos de concreto junto aos revestimentos argamassados e estrutura de concreto armado ganham destaque frente aos demais sistemas. Diante disso apresentaremos a seguir as principais patologias e os principais fatores que podem originar sua ocorrência nesse sistema em específico.
Estrutura: De acordo com Santos, Silva e Nascimento (2017), as patologias em estruturas de concreto armado ocorrem devido a um processo de degradação natural da estrutura, que é responsável pela diminuição do desempenho e vida útil. Sendo as principais manifestações patológicas nas edificações o mofo, bolor, fungos, manchas de umidade, eflorescências e fissuras.
PATOLOGIA | FATORES INTERVENIENTES |
Mofo, bolor e fungos | São a manifestação de um tipo de micro vegetal ou fungo que quase sempre assume uma coloração escura (quase preta), pois as enzimas liberadas pelos fungos atuam como um ácido sobre o material onde eles se proliferam, o que inevitavelmente ocasiona o surgimento de manchas, e em idades mais avançadas a desagregação da superfície. Para evitá-los, invista em iluminação natural. |
Manchas de umidade | As manchas de umidade possuem diversas origens, podendo ser decorrentes de infiltrações em telhados, vazamentos na rede pluvial, vazamentos em lajes de cobertura, falta de impermeabilização em terraços, etc. |
Eflorescências | As eflorescências possuem o aspecto de crostas brancas de carbonato de cálcio na superfície do concreto e são decorrentes da migração de componentes salinos do interior da estrutura para seu exterior. Para o surgimento desse tipo de patologia são necessários 3 fatores que possuem o mesmo grau de importância, são eles: o teor de sais solúveis presentes nos materiais ou componentes, a presença de água e a pressão hidrostática, que faz com que a migração da solução ocorra, indo para a superfície. |
Fissuras | São consideradas as manifestações patológicas características das estruturas de concreto. Suas causas são as mais diversas, podendo ser devido a: deficiências de projeto, contração plástica do concreto, assentamento do concreto, movimentações de formas e escoramentos, retração do concreto, deficiências na execução, reações expansivas, corrosão de armaduras, recalques diferenciais, variação térmica e ações aplicadas, como por exemplo choque de veículos. |
Revestimentos argamassados e alvenarias: Os elementos de vedações fazem parte de um ambiente onde convivem com outros elementos constituintes da edificação, tais como o arcabouço estrutural, microclima e propriedades físicas e químicas inerentes a cada material. Nesse contexto, o complexo ambiente viabiliza o surgimento de manifestações patológicas nos elementos de vedação — quase sempre de difícil diagnóstico —, uma vez que o agente causador age de forma não isolada, mas sim conjunta dentro da influência de diversos outros fatores.
De acordo com Ceotto et al (2005), as principais patologias dos revestimentos e alvenaria podem ser aplicadas tanto aos ambientes externos quanto aos internos e caracterizam-se basicamente em: fissuras e trincas, descolamento do revestimentos e alteração precoce no aspecto original do material (perda de coloração, baixo desempenho etc).
PATOLOGIA | FATORES INTERVENIENTES |
Infiltração | Nos revestimentos de argamassa, podem ocorrer devido à porosidade do reboco, não execução de juntas ou utilização de saibro. Na alvenaria de vedação, podem ocorrer por falta ou deficiência de impermeabilização (ascensão capilar) na estrutura ou devido a problemas de drenagem. |
Descolamento do Revestimento | Nos revestimentos de argamassa, podem ocorrer devido à hidratação da cal, que apresentam grande quantidade de cimento e cal na argamassa devido à espessura da camada de argamassa (reboco) estar muito grossa ou muito fina, ao tipo de superfície da base (rugosidade) onde o revestimento está sendo aplicado ou devido à ausência de camada de chapisco ou por excesso de finos no agregado. |
Bolor | Costumam ocorrer devido à presença de umidade em excesso ou má ventilação do ambiente, por conta da adoção de um traço de argamassa inadequado ou por conta do local estar exposto a constante ação de chuva. |
Desplacamento do revestimento argamassado | Costumam ocorrer em locais de grande espessura de revestimento, devido à aplicação de materiais inadequados para finalidade ou por conta da falta de aplicação de chapisco. |
Fissuras na própria argamassa de assentamento. | Ocorrem devido retração hidráulica da argamassa, e costumam ocorrer quando aplicadas argamassas excessivamente rígidas, com baixa retenção de água. |
Fissuras na interface argamassa de assentamento e bloco | Deficiência devido a erros de execução. Costumam ocorrer quando aplicadas espessuras elevadas da argamassa para assentamento dos blocos ou utilizado blocos excessivamente secos. |
O que fazer para se precaver ou tratar a patologia das edificações?
Quando ficamos doentes, grande parte das vezes acabamos procurando farmacêuticos ou soluções na internet. Soluções essas que quase sempre falham e que podem trazer consequências negativas à nossa saúde. A automedicação ou a consulta a profissionais não qualificados trazem consigo um grande risco. E isto serve também para edificações.
Quando estamos doentes vamos ao médio e ele nos examina, mas quem procuramos ou o que devo fazemos quando quem está doente é a casa?
A resposta para essa pergunta será dada em outro post, onde conversaremos a respeito de inspeções prediais na construção civil. Esta prática é realizada por engenheiros civis especialistas da área de patologias das edificações, que busca manter as edificações em boas condições de uso para os usuários.
Imagem da capa: PUC Rio